ARY DOS SANTOS
Serei tudo o que disserem": Ary morreu há 30 anos
Foram dele muitas das palavras sobre as portas que abril abriu.
Poeta empenhado, militante, apaixonado por causas e pessoas, José Carlos Ary dos
Santos morreu há 30 anos.
A vida e obra deste criador exuberante serão lembradas em Lisboa
este fim de semana. A Sociedade Portuguesa de Autores (SPA) programou para hoje,
às 18h30, no Auditório Frederico de Freitas, uma palestra a cargo de Ruben de
Carvalho, um dos grandes amigos de Ary dos Santos. José Fanha dirá poemas do
livro "Fotos-Grafias".
Também o espetáculo "Ary rima com Lisboa", que conta com Fernando
Tordo (voz e guitarra), com a cantora Mitó Mendes, do grupo "A Naifa", e com
João Tordo na sua faceta de contrabaixista, homenageia o poeta, amanhã a partir
das 18h, no Jardim de Inverno do Teatro S. Luiz.
Nos olhos uma folha de hortelã
José Carlos Pereira Ary dos Santos nasceu em Lisboa a 7 de
dezembro de 1937 no seio de uma família da alta burguesia. Nasceu depois, de
novo, para a poesia, aos 14 anos, quando a família lhe publica, contra a sua
vontade, alguns poemas no livro "Asas".
Aos 16 vê poemas de sua autoria serem selecionados para a
Antologia do prémio Almeida Garrett. Foi aí que, rebelde, "caminhou de olhos
deslumbrados" rumo à independência, saindo de casa dos pais. Vendeu máquinas de
pastilhas, foi paquete na Sociedade Nacional de Fósforos, escriturário no Casino
Estoril, fez publicidade.
Terá sido tudo isso e muito mais, mesmo se o que verdadeiramente
o movia era o irreprimível desejo de poesia. Em 1963 é publicado o livro de
poemas "A liturgia do sangue".
No ano seguinte lança o "Tempo da lenda das amendoeiras" e o
poema "Azul existe", representado no Tivoli, no Teatro da Estufa Fria e na
RTP.
Os estudos nunca foram lineares. Foi expulso do Colégio Infante
Sagres, passou pelo colégio interno Instituto Nuno Álvares, em Santo Tirso, e
não chegou a concluir nenhum curso superior, apesar de ter frequentado as
faculdades de Direito e de Letras de Lisboa.
"Original é o poeta" e, por isso, Ary dos Santos foi
continuadamente publicando livros de poesia.
"Adereços, endereços", em 1965; "Insofrimento in sofrimento", em
1969; "Fotos-grafias" (apreendido pela PIDE em 1971); "Resumo", em 1973; "As
portas que abril abriu", em 1975; "O sangue das palavras", em 1979; e, em 1983,
"20 anos de poesia".
À data da sua morte preparava a obra "As palavras das cantigas",
publicado em 1989 pelas Edições Avante!, com coordenação de Ruben de
Carvalho.
Estava também a escrever uma autobiografia romanceada, que
desejava cunhar de "Estrada da Luz - rua da saudade". Postumamente, em 1994, foi
editada "Obra poética", coletânea dos poemas de Ary dos Santos.
A sua voz vibrante fá-lo declamador em várias edições
discográficas. O seu primeiro disco, "Ary por si próprio", sai em 1970. No ano
seguinte participa no LP "Cantigas de amigos", juntamente com Natália Correia e
Amália Rodrigues.
Em 1974 é divulgado "Poesia política"; em 1975 "Llanto para
Afonso Sastre y todos"; em 1977 "Bandeira comunista"; em 1979 "Ary por Ary" e,
no ano seguinte, "Ary 80", reeditado em CD em 1999.
Era uma vez um país
Ary dos Santos foi, também, um ativo militante político. Correu o
país de lés a lés, às vezes sozinho perante plateias emocionadas com o seu
singular modo de dizer poesia, às vezes em sessões organizadas por estruturas
populares nas quais participavam também os cantores de intervenção que, como
ele, através da música e das palavras, tentavam interpretar o sentir de todo um
povo.
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